Tribunal administrativo aprovou 21 novas súmulas, as primeiras desde a operação ZelotesO Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) rejeitou, no início de setembro, uma proposta de súmula que visava a proibir o aproveitamento fiscal de ágio em reestruturações societárias que envolvem empresas de um mesmo grupo econômico. Em votação apertada de cinco votos a cinco, que dividiu conselheiros representantes da Fazenda e dos contribuintes, a 1ª Turma da Câmara Superior refutou a sugestão de enunciado.O resultado contra a proposta foi possível porque dois conselheiros que normalmente votam pela impossibilidade de aproveitamento do ágio interno se posicionaram de forma contrária à súmula. Os votos foram da conselheira Cristiane Silva Costa, vice-presidente do Carf, e do conselheiro Demetrius Nichele Macei, que compõem a 1ª Turma da Câmara Superior do tribunal administrativo. Apesar de seus posicionamentos contrários ao ágio interno, os julgadores consideraram que a redação da proposta de súmula dava margem para muitas interpretações distintas.Na sessão, o Carf aprovou 21 novas súmulas e cancelou um enunciado já existente. As mudanças entram em vigor quando publicadas no Diário Oficial da União.É a primeira vez que o Carf debate a criação de súmulas desde que a Polícia Federal deflagrou a operação Zelotes, em 2015, para investigar irregularidades no tribunal administrativo. A última súmula havia sido aprovada pelo Carf em 2014.As propostas aplicáveis a todas as turmas do Carf foram discutidas nessa segunda pelo Pleno do tribunal administrativo, que reúne 26 conselheiros, dos quais 13 representam a Fazenda e outros 13 representam os contribuintes. Para o Pleno aprovar uma sugestão é preciso o aval de no mínimo 16 julgadores, número que corresponde à maioria de três quintos.Após a sessão do Pleno, iniciada às 9h, reuniram-se separadamente as três turmas da Câmara Superior para julgar as propostas que se aplicam especificamente a cada seção do Carf. Os colegiados contam com dez conselheiros em regime de paridade, e a maioria necessária para a aprovação é de seis julgadores.Ágio internoA possibilidade de amortizar o ágio da base tributável pelo Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e pela Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) em reestruturações societárias é uma das controvérsias tributárias mais polêmicas do tribunal administrativo, com autos de infração que chegam à casa dos bilhões. A proposta de súmula referente a um tipo específico de ágio, chamada de “ágio interno”, foi debatida ainda pela manhã na 1ª Turma da Câmara Superior.Esse tipo de ágio ocorre em operações societárias que envolvem empresas com controles comum. A sugestão de súmula sugeria proibir a amortização do ágio interno quando o valor fosse gerado artificialmente, sem que as empresas envolvidas tivessem de fato registrado um gasto com a operação. Entre os advogados que atuam no Carf, o resultado desta votação era um dos mais aguardados nesta segunda-feira.A amortização de ágio gerado internamente ao grupo econômico, sem qualquer dispêndio, não é dedutível na apuração do lucro real.Proposta de súmula rejeitada pelo CarfA vice-presidente do Carf, conselheira Cristiane Silva Costa, votou contra a proposta apesar de entender que as empresas não podem amortizar o ágio nessa hipótese. “A súmula dava margem a muitas interpretações. Não é que eu mudei de ideia, mas a redação da súmula pode melhorar”, argumentou.Já a presidente do Carf, conselheira Adriana Gomes Rêgo, votou pela aprovação da súmula sobre ágio interno por entender que a jurisprudência do tribunal administrativo é majoritária neste sentido e por considerar que o enunciado reduziria os litígios.A tese jurídica é: não pode amortizar se for ágio interno. Não ficaria prejudicada a análise do caso concreto. Mas a súmula pode ser aprovada futuramente se o enunciado for aperfeiçoado, para alguns [conselheiros] o problema foi só de redaçãoO coordenador da atuação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) no Carf, procurador Moisés Pereira, argumentou que a aprovação de uma súmula proibindo o ágio interno não traria tanta celeridade ao órgão. “As turmas do Carf já entendem que o ágio interno é inadmissível. Com a súmula, as turmas discutiriam como foi a operação do contribuinte para ver se é ágio interno ou não. Na prática não teria muita diferença para o que já é feito hoje”, disse.Juros sobre multaEntre os novos enunciados aprovados nesta segunda, a presidente do Carf destacou como mais relevante a súmula que estabeleceu a incidência de juros calculados com base na taxa Selic sobre as multas de ofício. Como a proposta foi aprovada pelo Pleno, o enunciado deverá ser observado por todas as turmas do tribunal administrativo.“Para o Carf todas as súmulas aprovadas são muito importantes, mas a dos juros sobre multa vai reduzir muito litígio”, enfatizou. Segundo a presidente, grande parte dos recursos que chegam à Câmara Superior debatem esta matéria.O enunciado foi aprovado por maioria de 20 votos a seis, com posicionamento favorável de sete conselheiros representantes dos contribuintes. Segundo a conselheira Viviane Vidal Wagner, que defendeu a proposta, as três turmas da Câmara Superior e os colegiados que debatem Direito Público no Superior Tribunal de Justiça (STJ) costumam manter a incidência da taxa Selic sobre a penalidade.Independentemente de o conselheiro ser favorável ou contrário a essa matéria no mérito, a jurisprudência é pacificada. A súmula é útil porque extinguiria boa parte dos litígios.Por outro lado, a conselheira Ana Paula Fernandes sustentou que o Carf não deveria aprovar uma súmula sobre o tema. “A jurisprudência do STJ não é pacífica, na verdade é bem controvertida. Ainda acho que ela vai virar nos tribunais superiores. Não é pacífico nem no Carf”, defendeu.Como as súmulas são vinculantes no Carf, as turmas ordinárias são obrigadas a aplicar os enunciados aos processos que discutem a matéria, o que reduz o tempo de discussão entre os conselheiros e diminui o número de novas demandas. Se as partes recorrerem à Câmara Superior pedindo a reversão de acórdãos baseados nas súmulas, os recursos especiais sequer são conhecidos na instância máxima do Carf.Como exceção a esse procedimento, a Fazenda Nacional ou o contribuinte podem argumentar na Câmara Superior que a súmula foi aplicada indevidamente pela turma ordinária. Caso uma câmara baixa profira julgamento em sentido contrário à súmula, as partes podem pedir a aplicação do enunciado à última instância do Carf.
Fonte: Jota